O embaixador do
Brasil na Rússia, Antônio Guerreiro, concedeu uma entrevista exclusiva à
Sputnik para falar dos temas mais atuais das relações dos dois países,
envolvendo áreas de defesa, tecnologia, economia e saúde. A seguir,
estão alguns dos principais tópicos abordados nessa entrevista.
Um dos principais temas tratados na entrevista foi a compra dos
sistemas russos de defesa anti-aérea Igla-S e Pantsir-S1 pelo Brasil.
Enquanto o país já começou a receber lotes do sistema portátil Igla, a
aquisição dos pesados sistemas Pantsir ainda está em fase de
negociações.
Acalmando o temores de este segundo acordo não se concretizar, o
embaixador explicou que, por tratar-se de sistemas completamente
diferentes do ponto de vista técnico, a compra de um não deve
influenciar a provável compra do outro.
"Desde que cheguei à Moscou, há dois anos,
houve várias missões técnicas do Brasil vindo para cá para manter
contato com suas contrapartes russas.(…) Minha expectativa é que o
contrato [sobre o Pantsir-S1] seja assinado até o final de 2016" – disse
o embaixador.
Segundo ele, a assinatura do acordo está atrelada à aprovação do
orçamento do Governo Federal pelo Congresso, que inclui gastos com os
sistemas russo de defesa antiaérea, mas que somente poderá ser aprovado
após o recesso do Legislativo, ou seja, após o Carnaval.
Respondendo à pergunta sobre a difícil situação econômica do Brasil
poder influenciar de forma negativa esse documento, o embaixador disse
que, "apesar de ter o direito de não aprovar o orçamento", dificilmente
isso poderá ocorrer, podendo, no entanto, haver modificações, ou cortes
no orçamento.
Apesar da crise, precisamos levar em conta que
somos um país muito grande, com uma das maiores economias do mundo. (…) O
último número que eu ouvi para a compra dos sistemas russos de defesa
antiaérea Pantsir-S1, estava na base dos 600 milhões de dólares. Mas
isso é uma cifra apenas provisória, que ainda será objeto de
conversações específicas" – explicou o embaixador.
GLONASS
O embaixador respondeu a uma pergunta relativa às negociações sobre a
instalação em território brasileiro de uma terceira estação do sistema
de localização por satélite GLONASS, análogo ao norte-americano GPS. O
início das obras estava previsto para final de 2015, mas, até agora, a
instalação ainda não começou.
Como se sabe, duas estações GLONASS já estão funcionando no Brasil.
Espero que a decisão sobre a terceira estação seja tomada este ano, e
que a mesma comece a operar em breve. É uma questão de interesse mútuo
tanto para o Brasil, como para empresas russas que fornecem os
equipamentos" – explicou Guerreiro.
Rússia e o programa espacial brasileiro
Outro tema abordado na entrevista foi a questão de uma possível
expansão da cooperação da Rússia com o Brasil na área do programa
espacial brasileiro.
O embaixador disse que, recentemente, problemas financeiros impediram
uma possível cooperação do Brasil com a Ucrânia para o uso conjunto da
base espacial de Alcântara. Ele explicou, no entanto, que, apesar de
todo o interesse brasileiro na Rússia, o lugar da Ucrânia não será
substituído por outro país nesse projeto específico.
"Naturalmente, o Brasil está interessado no futuro desenvolvimento da
cooperação com a Rússia, e temos grandes perspectivas. Mesmo se um dia o
projeto com a Ucrânia for renovado, existirão outras áreas possíveis
para a cooperação com a Rússia" – explicou Guerreiro.
Comércio em moedas nacionais
Falando sobre a possibilidade de empresas da Rússia e do Brasil
realizarem operações de importação e exportação sem o intermédio de
moedas estrangeiras, o embaixador ressaltou a importância desse tema.
Nas suas palavras, há economistas no Brasil favoráveis a esse modelo, e
outros que acham que isso não faz o menor sentido.
"Evidentemente, os empresários, dada a desvalorização tanto do rublo,
como do real, têm interesses muito específicos. Para os empresários
brasileiros e russos ficou mais barato exportar. Mas isso não significa
que as exportações estejam aumentando porque é um momento de crise, e
tanto o Brasil como a Rússia tiveram suas atividades econômicas
diminuídas" – disse Guerreiro.
Como exemplo, ele usou a questão das exportações brasileiras para a
Rússia. Apesar das expectativas de aumento, por conta das contra-sanções
impostas pela Rússia à União Europeia e outros países, em 2015
as exportações brasileiras caíram em relação a 2014. "Por um motivo
muito simples: os importadores russos estão com menos dinheiro" –
explicou o embaixador.
Falando em números, ele disse que em 2014 o volume total das
exportações brasileiras para a Rússia foi de 3 bilhões e 200 milhões de
dólares, enquanto em 2015 o mesmo não chegou a 2 bilhões e 700 milhões
de dólares.
Zika
Abordando o tema do crescente problema da Zika no Brasil, o
embaixador disse que o vírus não deverá prejudicar a realização dos
Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, já que o principal foco de
disseminação da doença está no Nordeste do país, e o mês de agosto,
quando serão sediados os Jogos, é a época de menor proliferação do
mosquito transmissor.
Nesse sentido, ele comentou ainda a decisão do Comitê Olímpico
Nacional dos EUA em outorgar aos seus atletas o livre arbítrio sobre o
comparecimento aos Jogos, em razão do risco de contaminação.
Não considero o precedente [do Comitê norte-americano] perigoso. Acho
perfeitamente natural que a pessoa não se exponha se tiver o receio de
contrair a doença. (…) É, sem dúvida, uma questão de bom senso" – disse o
embaixador.
Sobre a cooperação entre a Rússia e o Brasil na busca por soluções
médicas para o problema, Guerreiro explicou que "a OMS está coordenando
esforços no mundo inteiro para que se desenvolva uma vacina eficiente".
Ele disse ter a certeza de que "os cientistas de todos os países estejam
em contato (…), trabalhando em conjunto", e que "os estudos que se
fazem aqui na Rússia, sejam conhecidos pelos cientistas no Brasil, e
vice-versa".